Fato é que estando o empreendimento inserido na realidade do mercado brasileiro, é essencial para a inciativa que seja desenvolvida com bastante responsabilidade legal, sendo necessária muita cautela no intuito de sobrevivência da empresa em detrimento das regras jurídicas atuais, muitas vezes incompatíveis com a nova realidade.
Por: André Queiroz Barbeiro Lima e Marcelo Tavares Cerdeira.
O mundo do mercado evolui constantemente, e não podia ser diferente com as novas formas de organização de produção e empreendedorismo. Nesse sentido, é cada vez mais comum ouvirmos no mercado o termo “startup”, pequenas empresas voltadas ao empreendedorismo dinâmico e inovador, principalmente no setor de serviços, tendo como característica principal o uso da tecnologia e de soluções inteligentes, sejam de logística ou mesmo de integração de dados.
De modo geral as startups passaram a ser difundidas no Brasil em 2011, sendo certo que de 2012 a 2018 o número de empreendimentos dobrou, de 2519 para 5147 startups, conforme estudo recente da ABStartups (Associação Brasileira de Startups). Esse cenário traduz justamente parte do conceito e da vantagem da startup, qual seja a capacidade de especificação do serviço e os infinitos nichos de mercado que tal especialidade pode alcançar com as soluções tecnológicas, de produção, de logística, etc.
Ainda, ressalta-se que, com a criação do fundo Softbank, de 5 bilhões de dólares, dedicado à América Latina, bem como a formação recente das denominadas startups Unicórnio no Brasil – que pela analogia à mitologia é referência a um enorme feito como por exemplo obter superavaliação antes mesmo de abrir o capital na bolsa – a perspectiva de crescimento desse tipo de empreendedorismo inovador tem terreno fértil no país, não a toa já em 2017 os investidores-anjo injetaram R$ 984 milhões nas startups brasileiras, conforme dados da Organização Anjos do Brasil, organização sem fins lucrativos que tem como escopo fomentar crescimento de novos empreendimentos de inovação no país.
Ocorre que, como todo empreendimento, as “startups” estão sujeitas a se adequarem à legislação pátria tributária, societária, trabalhista, contratual etc., podendo correr um grande risco de passivos nessas áreas, como ocorreu recentemente com a Uber no processo CC 164544/MG (2019/0079952-0), onde o STJ, em 4/9/19, reconheceu em sede de Conflito de Competência como relação de prestação de serviços de âmbito cível o contrato firmado entre a empresa e o motorista, portanto, afastando a competência da Justiça do Trabalho, o que, neste caso, afastou um risco trabalhista gigantesco; havendo contudo decisões da Justiça do Trabalho diversas sobre o tema, como a do TRT2 – São Paulo/SP que no processo PJE 1000123-89.2017.5.02.0038, atualmente em trâmite no TST e ainda sem decisão final, concluiu que há vínculo de emprego configurado entre a empresa e o motorista do Uber, o que demonstra que a exata classificação jurídica das novas modalidades contratuais é algo ainda incerto, e portanto passível de riscos.
Assim, não obstante o potencial inovador dessa nova modalidade empresarial que tem tudo para crescer e se sobrepor aos modelos anteriores, a experiência demonstra que nem sempre essa é a realidade. Conforme dados da ABStartups, quatro em cada cinco “startups” não sobrevive após 5 anos de nascimento. E isso ocorre por motivos diversos, desde formação de passivo judicial mormente trabalhista, adequação muitas vezes imperfeita do modelo tributário, falta ou equívocos no registro de marca, falta de liderança e governança societária na gestão; enfim, inúmeras razões que levam ao fim do sonho de crescimento, sendo certo que 18% das “startups” brasileiras encerram suas atividades com menos de 2 anos, conforme dados da Startup Farm, aceleradora e incentivadora dessa modalidade empresarial então mapeada.
Nesse sentido, considerando a oferta de escritórios de advocacia do país, tem-se que esse nicho voltado especificamente à assessoria de “startups” é algo ainda pouco explorado, apesar de muito necessário. Isso pois, além da necessidade de compreender suas particularidades disruptivas, fases de captação, modelo lean de planejamento, breakeven, dentre outros detalhes, igualmente é necessário que a consultoria jurídica se adeque à forma de cobrança e de oferta de trabalho inerente à nova modalidade contratual, uma vez que o setor, em sua maior parte, não tem capital estável inicial, necessitando de uma consultoria rápida e flexível sobre modelos contratuais adequados a toda a cadeia de operacionalização do negócio que envolve muitas vezes subcontratações, o que exige uma necessária assessoria jurídica especializada, com conhecimento específico nas esferas Contratual, Cível, Trabalhista e Tributária, considerando a necessidade de aplicação diferenciada, atualizada e flexibilizada dos modelos jurídicos hoje existentes. Isso diante de reais e novas necessidades, dentre outras demandas, que são presentes no desenvolvimento dessa operação tão inovadora.
Portanto, em que pese o caráter jovem, inovador e promissor da nova modalidade, fato é que estando o empreendimento inserido na realidade do mercado brasileiro, é essencial para a inciativa que seja desenvolvida com bastante responsabilidade legal, sendo necessária muita cautela no intuito de sobrevivência da empresa em detrimento das regras jurídicas atuais, muitas vezes incompatíveis com a nova realidade.